Se você quer empreender ou está namorando essa ideia, e está em dúvida sobre onde focar suas energias, esse texto pode te ajudar. Aqui eu proponho uma abordagem para seu fluxo de ideias e quais as principais atividades e resultados você precisa se preocupar em cada etapa.

Sugiro que, depois de ler, adapte essa abordagem pras suas necessidades e pro seu modo de funcionar. Por experiência própria, sei que adotar métodos de outras pessoas pode dar uma certa estranheza na prática, mas também sei que é melhor ter algo de onde partir. Que esse texto seja seu ponto de partida.

Quero começar falando sobre a sua relação com as suas ideias.

Sua ideia é só uma ideia

Você não precisa ser apegado a cada uma de suas ideias. Já ouvi de muitas pessoas interessadas em empreender que tem medo de suas ideias serem copiadas. Minha dica nesse caso é: perca esse medo, suas ideias vão ser copiadas mais cedo ou mais tarde. O que vai fazer sua empresa sobreviver é como você executa sua ideia, e não a ideia em si.

Pra praticar esse desapego, eu tenho três exercícios pra recomendar.

O primeiro é praticar a separação entre ideia e execução, e entender que a execução que é a parte mais importante. Pegue exemplos de empresas renomadas, entenda a ideia por detrás dela e veja quantas outras empresas tentaram executar a mesma ideia. Bons exemplos são: Google, Spotify, 99, Nubank, MercadoLivre. O que tem de diferente entre eles e os que tentaram é a execução, e não a ideia. Uma boa ideia com uma execução ruim é muito pior do que uma ideia fraca com uma execução impecável.

O segundo exercício é simplesmente achar uma forma de ter mais ideias. Se você tem muitas ideias, você acaba se apegando menos a cada uma delas. Um ponto importante aqui é você entender que pra você ter uma ideia boa, você precisa ter muitas ideias, e a maioria delas vai ser ruim. Não tenha vergonha de ter ideias ruins, tenha vergonha de não ter ideias.

O último exercício dessa lista é compartilhar sua ideia. Você vai perceber que falar dela pra outras pessoas tem efeitos muito positivos. Ela fica cada vez mais clara pra você, cada vez que você fala percebe um elemento novo. Pra cada nova pessoa que você conta, surgem novas ideias ou aparecem novos desafios que só percebeu porque falou, porque alguém questionou algo de um ponto de vista que você não tinha. E agora sua ideia tem a chance de ficar mais forte porque tem mais pontos de vista incorporados.

Desapegou? Pronto, agora vamos ao ciclo de vida das ideias.

O ciclo de vida das ideias

As ideias têm uma historinha só delas. Elas nascem, crescem, se transformam e algumas poucas vezes são executadas. Entre um ponto e outro dessa trajetória, a maior parte das vezes elas são abandonadas.

Os nomes que dei aqui foram criados por mim mesmo, com a intenção apenas de descrever as fases: Nascimento, Questionamento, Clarificação, Preparação, Execução e Abandono. Pra cada uma delas, vou descrever quais são as atividades e os resultados esperados.

💡 Nascimento

Uma ideia de empresa surge quando você consegue conectar problemas com potenciais soluções. Pra que isso aconteça, você precisa de informações e processos.

As informações são importantes principalmente pra dar contexto pras ideias, tornando possível ver as conexões entre problemas e soluções. Aqui vão algumas formas de coletar informações:

  • Manter uma lista de problemas que você enfrenta no dia-a-dia
  • Ouvir com curiosidade os problemas que outras pessoas enfrentam
  • Manter-se atualizado com novas tecnologias
  • Pesquisar startups em outros países
  • Explorar aplicativos e serviços novos, mesmo que sejam de problemas que você não tenha
  • Refletir como conceitos podem ser transferidos de uma empresa pra outra. Ex: conceitos de marketplace, atendimento ao cliente automatizado, crowdsourcing, inteligência artificial, freemium, etc.

Os processos são formas de incentivar que as ideias surjam, que as conexões entre os problemas e as potenciais soluções sejam feitas. Aqui vão algumas sugestões de atividades:

  • Reunir-se com amigos para discutir soluções para os problemas da sua lista
  • Pensar em formas de melhorar serviços e produtos já existentes
  • Estudar como funciona um mercado completamente desconhecido por você
  • Praticar atividades criativas e lúdicas: tocar um instrumento, desenhar, dançar, contar piadas, fazer mágica. Você não precisa ser bom na atividade, a ideia é relaxar sua mente pra que as conexões aconteçam. Quem nunca teve um ideia genial durante o banho?

❓ Questionamento

Pronto, uma ideia nasceu. Agora, a primeira coisa que essa ideia precisa fazer é ser questionada. O principal objetivo aqui é descobrir a força dessa ideia, tanto do ponto de vista de qualidade quanto de desafios.

Vamos começar com a parte fácil, que parece óbvio mas muita gente não faz: joga sua ideia no Google. Joga sua ideia nas lojinhas de aplicativos (iPhone e Android). Analisa com cuidado os resultados e tenta perceber a similaridade do que está escrito ali com a sua ideia inicial. Instala os aplicativos existentes, mesmo que eles sejam diferentes da sua ideia. Eles apareceram na sua busca por algum motivo, tenta descobrir o porquê.

Se não encontrar informações úteis e relevantes, experimenta pesquisar coisas relacionadas ao público-alvo da sua ideia, aos potenciais concorrentes dela, ao problema que você acha que ela resolve. Assume que sua ideia já foi implementada em algum lugar e que você tá caçando o que aconteceu com ela.

Se você souber outras línguas, experimenta pesquisar informações de outros países.

No final da sua pesquisa, você deve saber com mais clareza se sua ideia já foi implementada, ou se algo similar já foi implementado. Agora você precisa refletir sobre essa descoberta.

Se sua ideia já foi implementada, não significa que você precisa desistir dela. A maior parte das grandes empresas não foi pioneira, as ideias já existiam (Google, Facebook, Nubank, Spotify, Tinder, Youtube, etc). A reflexão a ser feita aqui é como sua ideia pode competir com a solução existente, qual o diferencial, qual valor que só você pode entregar pro seu público-alvo.

Vale a pena também entender se a sua ideia já foi implementada e não deu certo. Nesse caso você precisa refletir se você quer correr o risco de não dar certo com você também.

Se sua ideia não foi implementada, a reflexão a ser feita é descobrir a razão disso. Existe muita gente inteligente e inovadora no mundo, por que será que elas não implementaram isso? Existe algum impedimento técnico? Existe algum recurso que é difícil de conseguir?

Depois de toda essa pesquisa e reflexão, cabe a você decidir se quer abandonar essa ideia aqui ou seguir pra próxima etapa, que é clarificar a sua ideia.

🔬 Clarificação

Está na hora de começar a esboçar a sua ideia, começar a ter algo mais concreto e palpável. O objetivo desta fase é descobrir detalhes importantes que estavam desapercebidos, encontrar as principais oportunidades e desafios de implementação.

Minha recomendação é desenhar, num papel ou numa lousa, como seria o sistema que implementaria sua ideia. Se você puder faça em grupo, envolva potenciais sócios. Desenhem as telas do app ou do site, formulários de cadastro, fluxos de informações, pontos de interação do usuário ou cliente, como seu cliente vai encontrar o seu sistema, o que vai fazer ele desistir, o que vai fazer ele se apaixonar.

Faça o mais completo que conseguir. Pense em como o usuário vai te pagar, se ele vai por cartão de crédito. Se vai poder usar sem cadastrar ou não, se ele vai receber emails e notificações, se o aplicativo vai funcionar sem internet. Pensa como seu site vai explicar seu sistema, como vai ser a cara do aplicativo na lojinha de aplicativos. Se for um sistema pra empresas, pensa qual área da empresa que os usuários vão pertencer, se é essa mesma área que vai tomar a decisão de implementar o sistema ou não - muitas vezes não é.

Vale a pena considerar o cenário e o escopo. Existem concorrentes? Como você se diferencia? Vale a pena separar um pedaço dos usuários e focar somente neles? Ou o contrário, aproveitar essa ideia pra mais gente e ter ainda um público-alvo maior?

E, pra ser um negócio, a sua ideia precisa dar dinheiro. É importante pensar quem vai pagar, quanto vai pagar, como vai pagar e por que vai pagar. Os usuários estariam dispostos a pagar um valor que cobre os custos do sistema? Existe recorrência suficiente? Você consegue capturar o valor que tá gerando pra ele de alguma outra forma?

Neste post você pode encontrar diversas outras perguntas legais pra se fazer.

No fim dessa fase, você vai ter uma boa ideia do que chamamos de proposta de valor da empresa. Esse é, basicamente, o motivo que as pessoas ou empresas vão comprar seu produto: uma combinação de produto, serviço e preço. “Eu contrato sua empresa porque ela me traz tal benefício, que vale muito mais do que o preço que ela cobra”.

Agora sua ideia já tem forma e detalhes. Seu trabalho é olhar pra tudo isso e encontrar as oportunidades e os desafios. Os desafios podem inclusive ser tão grandes que você queira parar por aqui. Não tem problema, abandona essa ideia e parte pra próxima. Caso contrário, vamos seguir pra algo mais prático.

💪 Preparação

Com uma ideia bem formada e desenhada, você pode partir pra construir um plano de ação. Recomendo que comece o plano de ação listando suas principais preocupações sobre a ideia. Podem ser o valor a ser cobrado, uma dúvida se uma certa funcionalidade é possível de ser implementada, se os seus clientes frequentam tal tipo de rede social, etc.

Com essas preocupações, você pode construir suas próprias hipóteses. Por exemplo, hipótese de que o usuário está disposto a pagar R$10,00 por mês; que as pessoas preferem comprar seus produtos via realidade aumentada; que elas se incomodam com a quantidade de calorias que existem nos alimentos; etc.

Também vão surgir preocupações mais estruturais. Qual time eu preciso pra colocar essa ideia em prática? Preciso de um armazém? Servidores dedicados? Preciso de dinheiro pra estocar materiais? Preciso desenvolver alguma tecnologia específica?

Agora, escolha algumas hipóteses pra serem testadas. E também simplifique ao máximo suas estruturas, diminua time, elimine armazéns, descubra o que dá pra fazer sem dinheiro. Com isso você pode criar o seu protótipo.

Um protótipo ou MVP (produto mínimo viável, em inglês), é uma forma de oferecer pra alguns poucos clientes o valor que você quer entregar no seu produto final, com uma solução bastante simplificada e com pouco trabalho. O principal objetivo é validar as hipóteses que você listou, aprender antes de partir pro seu produto real.

Se o seu protótipo não for pensado pra te responder se suas hipóteses estão certas, ele não é um bom protótipo. Faça alterações no seu plano até que seu protótipo sirva pra te dar as respostas certas.

A simplicidade e o pouco esforço podem aparecer de diversas formas: pode ser apenas um site simples feito em sistemas como Wix, pode ser apenas um serviço via email ou whatsapp, pode ser uma planilha eletrônica com um formulário online, pode ser um perfil de venda num site como MercadoLivre. O importante é que teste suas hipóteses.

Depois de oferecer seu protótipo pra alguns poucos clientes, converse com eles pra entender a experiência. Aqui você vai decidir entre parar a ideia por aqui, experimentar outro protótipo ou seguir com esse protótipo que você testou.

Se você optar por seguir com o protótipo que testou, o próximo passo é partir pra execução.

🚀 Execução

Com as ideias que você coletou no processo todo, você está pronto pra desenhar uma versão inicial do seu produto. Você já sabe como seu cliente pensa e percebe o valor que está criando, tem uma ideia da estrutura que precisa e tem que a confiança que é possível entregar, mesmo que parcialmente, o valor pro seu usuário.

Entrar em detalhes de execução está fora do escopo deste texto, mas eu tenho algumas recomendações pra quando chegar nessa etapa. O raciocínio que fez sobre simplificar e testar suas ideias deve ser aplicado sempre que possível, assim você aumenta a velocidade que você entrega as funcionalidades pro seu cliente, e também evita gastar esforços em iniciativas que você acha que tem valor e seu cliente acha que não.

Outra recomendação é não pular as etapas anteriores. Não parta da ideia diretamente pra execução, pelos mesmos motivos. Você vai acabar gastando energia em ideias que não estão prontas pra execução, vai se frustrar, e eventualmente parar de ter ideias.

🤷‍♀️ Abandono

Abandonar as ideias faz parte do processo criativo. Você fica mais confortável com isso cada vez que você passa por todo esse processo. Uma boa forma de pensar é: pra dar espaço pras próximas ideias, você precisa abandonar as atuais.

Mas, antes de abandonar, pensa o que você pode aprender com o processo que passou. Provavelmente você aprendeu mais sobre algum mercado específico, alguma tecnologia que não conhecia, alguma regulamentação, ou até mesmo descobriu algo sobre você mesmo.

E não se apegue demais as suas ideias. Se elas não forem boas, precisam ser abandonadas.

Por fim

Apesar do texto ser longo, o processo das ideias não precisa ser longo. É possível testar ideias diariamente, principalmente porque a maioria delas vai sendo abandonada nas primeiras fases.

Quanto mais avançada no processo a ideia está, mais trabalho ela dá. Na verdade, ter a ideia em si é a parte mais fácil da jornada de empreender, de longe. Por ideias em execução é um trabalho bastante intenso e exige bastante dedicação.

Espero que este texto te ajude a construir um fluxo de ideias que faça sentido pra você.

Desejo sucesso na sua jornada de empreendedor!